Crescimento e ciclos: 10 anos dos índices FipeZAP
Na semana passada detalhamos um pouco o processo inflacionário que vem assustando o mundo todo e impactando realidade e expectativas no Brasil. Como sempre busquei fazer conexões com o mercado imobiliário, mas falei menos do que gostaria sobre preços de imóveis, tema central nas contribuições que o ZAP+ tem feito há muito tempo através da DataZAP+ e do projeto FipeZAP. Vamos falar muito sobre preço de imóveis por aqui. Nesta edição quero oferecer um olhar macro e fazer uma retrospectiva do mercado, explorando a evolução do índice FipeZAP que completou 10 anos em 2021! Para pensar sobre o futuro é fundamental estudar a história.
Nossa retrospectiva inicia na primeira década dos anos 2000, quando a combinação de reformas regulatórias com crescimento econômico criou condições para um período de aquecimento expressivo e enorme transformação no mercado. As reformas regulatórias tinham como objetivo diminuir riscos que travavam o desenvolvimento do setor. Para lidar com riscos do lado da oferta foi instituído o Patrimônio de Afetação. Já no lado da demanda a inovação veio com a instituição da figura da Alienação Fiduciária. Riscos menores num contexto de expansão da renda gerou forte apetite para o crédito. Tudo junto, estavam dadas as condições para o período de forte dinamismo imobiliário que se iniciou em 2005 e foi até 2013/14. E como parte central deste processo observamos uma maior aproximação do setor com o mercado de capitais através de uma série de IPOs de incorporadoras e imobiliárias.
É nesse contexto que o índice FipeZAP foi forjado. A exuberância vista nos lançamentos, crédito e mercado de capitais gerou a necessidade de se acompanhar o setor mais de perto. Com isso ficou explícita nossa carência de informações. Não tínhamos sequer um índice de preços dedicado ao mercado imobiliário. Assim, em 2010, pesquisadores da Fundação Instituto de Pesquisas Imobiliárias – FIPE (Eduardo Zylberstajn e Prof. Helio Zylberstajn) tiveram a ideia de procurar o ZAP Imóveis para criar o primeiro índice de preços de imóveis do Brasil, o índice FipeZAP (eu e o Prof Juarez Rizzieri participamos desse processo como membros do comitê técnico que desenvolveu a metodologia do índice). No início tínhamos informações organizadas apenas para São Paulo e Rio de Janeiro. O projeto avançou muito e hoje contamos com índices de compra/venda residencial para 50 cidades, índices de locação residencial para 25 cidades e índices de compra/venda e locação de saletas comerciais para 10 cidades.
A serie do índice agregado inicia em 2008 e a análise da sua evolução nos permite identificar alguns períodos relevantes do mercado de lá para cá. Vamos nos concentrar na variação em 12 meses do índice (ver gráfico). O primeiro período, que vai até junho de 2011, mostra a força do dinamismo gerado durante o “boom” e é marcado pela aceleração no aumento dos preços. No pico, os preços estavam crescendo mais 30%! Como resultado, a oferta de imóveis novos se expandiu fortemente e diversas incorporadoras passaram a realizar lançamentos em cidades e regiões onde não operavam previamente. Todos sabíamos que esse processo não duraria indefinidamente (lembram dos ciclos?) e o debate sobre a eventual presença de uma bolha imobiliária no Brasil passou a dominar os analistas do setor. Nesse sentido, nossa visão sempre foi a de que no agregado não fazia sentido pensar na formação de uma bolha. O argumento era de que a pujança observada decorria do destravamento de um mercado que andava emperrado durante muitos anos, sendo que boa parte das transações tinha como motivação a aquisição da primeira residência (falaremos mais sobre bolhas imobiliárias em outro momento). O que não impedia a formação de processos locais de superaquecimento.
O período seguinte mostrou que estávamos corretos e o que se viu foi um processo de desaceleração gradual em que o crescimento dos preços dos imóveis permaneceu acima da inflação (medida pelo IPCA) até janeiro de 2015. Assim, aos poucos, foi ficando claro que a fase de crescimento acelerado tinha ficado para trás e a partir de 2013/14 a percepção de que um cenário desafiador estava se configurando se espalhou. Vale lembrar que o mundo estava digerindo a grande crise financeira (iniciada em 2009 justamente no mercado imobiliário) e no Brasil estávamos mudando de forma relevante a orientação das políticas econômicas (macro e micro).
Pois bem, a recessão econômica iniciada em 2015 no país marca a passagem para o meu terceiro período, quando o crescimento do FipeZAP passa a ser menor do que o IPCA.
Observamos que a variação dos preços de imóveis continua no campo positivo até maio de 2016 que depois permanece flutuando em torno de zero até maio de 2020. Aqui as dificuldades passaram a predominar e os ajustes tiveram que ser bastante fortes. Além da do menor volume de novos negócios, emerge um novo problema: o crescimento dos distratos. Neste momento, o debate virou e passamos a questionar se os preços de imóveis não deveriam cair mais e mais rápido. Analisando o processo percebemos que o forte ajuste nos volumes de transações estava reduzindo os ajustes nos preços. Essencialmente, muitos proprietários preferiam tirar seus imóveis do mercado em vez de vende-los por preços consideravelmente mais baixos (uma espécie de “circuit breaker” se compararmos com o mercado de ações).
O quarto período é que o estamos vivendo agora, coincidido com a pandemia e quando os preços voltaram a crescer, mas ainda perdendo da inflação (que como sabemos e foi discutido na última carta – Inflações – virou um problema global e central). Na minha primeira carta dessa nova temporada (O que será do amanhã? Mantemos o otimismo, mas ampliamos a moderação…) detalhamos os fatores que norteiam o momento atual e os elementos que compõem as perspectivas do que vem pela frente.
Nosso moderado otimismo com a continuidade do ciclo de expansão em curso reconhece a presença de forças contrárias impactando preços dos imóveis. De um lado, as pressões inflacionárias (gerais e setoriais) vão pressionar os preços para cima. De outro, renda real menor e expectativas de crescimento menos confiantes deverão puxar os preços para baixo. Ajustes na oferta e na demanda já estão em curso e especulamos sobre os efeitos líquidos na amplitude e duração do atual momento do ciclo. Temos incertezas de diversas naturezas nublando nossa capacidade de enxergar o que vem pela frente, mas uma coisa é certa: acompanhar os índices FipeZAP de perto permanecerá parte essencial de nossa estratégia para apoiar clientes e parceiros a navegar em qualquer cenário.
Finalmente, lembro a todos que na semana que vem teremos mais uma edição do Conecta Imobi!!
Oportunidade imperdível de aprendizagem e conexão com tudo o que precisamos para ampliar nossas chances de sucesso.
Grande abraço,
Danilo Igliori
VP Economista Chefe do ZAP+